Jorge Veludo acusa MNE de descurar o apoio aos emigrantes
«NUM país vocacionado para a emigração, não faz sentido descurar o apoio às comunidades», comenta Jorge Veludo, secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores Consulares e das Missões Diplomáticas (STCDE), para quem a «falta de visão estratégica» e os «erros de gestão» são os «pecados capitais» do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE). Em seu entender, a anunciada greve no Consulado de Portugal em Londres - que este sindicato não apoia - é «a ponta do icebergue de um fenómeno cada vez mais frequente: o recurso a trabalhadores contratados a termo certo. Até ao final deste semestre, os funcionários dos serviços externos neste regime deverão ultrapassar os 200». Aponta ainda «três situações aberrantes»: em Adis Abeba, Díli e Jacarta, os trabalhadores recrutados são meros prestadores de serviços.
Veludo acredita que os funcionários do Consulado de Londres se poderão inscrever na Segurança Social, «à semelhança do que fizeram todos os contratados a termo certo que trabalham na União Europeia», pelo que não subscreve aquela reivindicação. Quanto à retenção do Imposto sobre o Rendimento, explica tratar-se de uma regalia a que nem os 650 trabalhadores do Quadro Único de Contratação do MNE têm direito. «Há cinco anos que nos batemos para que a retenção se estenda a todos os funcionários», acrescenta.
O recrutamento de pessoal precário - «sem formação e, sobretudo, sem acreditação junto das autoridades locais» - associado à falta de quadros intermédios e à ausência de concursos, debilita o apoio às comunidades emigrantes, aponta. A situação que se está a viver no Canadá, com a deportação em massa de imigrantes portugueses ilegais, é, na sua opinião, consequência «deste desinvestimento nas estruturas de apoio que marca a acção do MNE nos últimos anos». Dá exemplos: dos 2100 lugares dos serviços externos do Ministério, apenas 1500 estão preenchidos. «Não havendo chefias intermédias - o vice-cônsul ou o chanceler são aqueles que na subordinação do cônsul ou do cônsul-geral fazem funcionar toda a máquina administrativa - há carências que não são colmatadas. Se a isto se juntar a ausência de instruções ao nível dos procedimentos de gestão, os postos estão condenados a funcionar de acordo com o critério que for estabelecido por cada cônsul». O posto de Portugal em Toronto, sem vice-cônsul há bastante tempo, está longe de ser uma excepção: «Dois terços dos nossos maiores consulados estão sem chefias intermédias», salienta. Mas há mais: «nos postos fora da União Europeia, existe apenas um técnico de serviço social a apoiar os emigrantes. Isto prova que as comunidades são o parente pobre da política externa portuguesa», afirma.
«Os nossos emigrantes são socialmente débeis, com uma afirmação de cidadania reduzida, pouca capacidade para adquirirem os conhecimentos necessários para se defenderem. Como se viu agora em Toronto, as pessoas foram para a porta do Consulado rezar. Estas são manifestações de desespero. O Estado tem a obrigação de apoiar a sociedade civil, e este trabalho de acompanhamento e apoio às comunidades é permanente», defende. Para Veludo, a solução passa por uma «aposta clara» nos recursos humanos: recrutamento de pessoal habilitado - os ingressos estão encerrados há seis anos - formação dos quadros, promoção de concursos para progressão na carreira. O sindicalista quer ter uma palavra a dizer na reestruturação consular anunciada por Freitas do Amaral. Perante o acréscimo de emigração e a diminuição de funcionários, «não me parece correcto o encerramento de postos», adianta. O recurso aos funcionários excedentários da Administração Pública é uma opção válida, «desde que sejam reciclados». «Importa atender às necessidades dos serviços sem aumentar o recrutamento a termo certo, sob pena do colapso ser geral», conclui.
Isabel Oliveira
EXPRESSO, Página 13, 1. Caderno, 1 Abril 2006