domingo, abril 02, 2006

Greve em Londres/Jornal Expresso

Em causa estão 19 funcionários consulares com contrato a termo certo há 5 anos

OS TRABALHADORES do consulado de Portugal em Londres vão iniciar uma greve de sete dias intercalados no próximo dia 5. Os portugueses que necessitarem de passaportes ou de outra documentação para viajar no período da Páscoa vão ver-se impossibilitados de resolver qualquer assunto no consulado de Londres nos dias 4, 5, 6, 11, 12, 19 e 20 de Abril. Em causa estão as condições de trabalho dos 19 trabalhadores que há cinco anos têm contrato a termo certo «ao arrepio» da lei laboral portuguesa, segundo dois dos signatários da greve, Rui Coutinho e Paulo Coimbra.
Há muito que a situação de ilegalidade destes trabalhadores face à legislação britânica é do conhecimento do Estado português. Segundo apurou o EXPRESSO, a 9 de Abril de 2003, o então vice-cônsul em Londres, José Amador, enviou um fax para a Direcção-geral da Administração-geral, onde apresentaram as propostas de contratos para os trabalhadores a termo certo. Nesse fax, o vice-cônsul chamava «a particular atenção» da administração para as obrigações fiscais relativamente ao Estado britânico que, a serem cumpridas pelas partes contratantes, «diminuiria os salários dos contratados para valores incomportáveis para o custo de vida no Reino Unido». A Administração-central respondeu a este fax de forma curta mas inequívoca: «Não existem objecções às minutas propostas». Por outras palavras, aceitando que os contratos propostos resultassem em evasão fiscal.
Por estas razões, os trabalhadores contratados do Consulado em Londres exigem que o Estado português enquanto entidade patronal comece a fazer a retenção e a entrega dos pagamentos à segurança social e para o IRS. «Não temos direito à segurança social, não temos protecção na doença, não temos direito à reforma, não temos acesso ao crédito à habitação pois não podemos provar os nossos rendimentos, e as trabalhadoras não podem ter filhos porque não têm direito a licenças de parto», explica Rui Coutinho.
A outra questão que preocupa os grevistas é a do seu estatuto profissional. Os trabalhadores contratados a termo certo, e que constituem dois terços da mão-de-obra do consulado em Londres, gostariam de ver o seu estatuto de trabalhador consular reconhecido, disse ao EXPRESSO Paulo Coimbra. Além disso, os trabalhadores contratados a termo certo exigem que o Ministério dos Negócios Estrangeiros reconheça o princípio de «salário igual para trabalho igual, independentemente do vínculo laboral dos trabalhadores». «Fazemos o mesmo trabalho que os trabalhadores consulares reconhecidos, trabalhamos as mesmas horas, mas não temos o mesmo estatuto e por isso não recebemos os mesmos salários ou temos acesso às mesmas regalias», esclarece Rui Coutinho.
Conscientes de que a comunidade portuguesa no Reino Unido - a rondar as 500 mil pessoas - é grande e com grandes necessidades, os organizadores da greve disponibilizaram dois grevistas para ajudar o consulado a resolver situações essenciais como a obtenção de documentos de viagem. No entanto, os organizadores da greve prevêem uma situação calma, pois o pré-aviso de greve foi emitido há já algum tempo, dando a oportunidade aos portugueses residentes no Reino Unido de marcar consultas para outras datas.

Eunice Goes, correspondente em Londres

EXPRESSO, Página 13, 1. Caderno, 1 Abril 2006
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